
Alexandre Reis
Quando programamos uma viagem para a Chapada Diamantina, logo pensamos em conhecer ou revisitar belas paisagens, como aquela do alto do Morro do Pai Inácio, em Palmeiras. Claro, as cachoeiras não podem ficar de fora, principalmente as mais incríveis, tal qual a do Buracão, em Ibicoara. Tem ainda as festas tradicionais, a exemplo do agitado São João de Mucugê. Ou as cidades históricas, tipo a charmosa Rio de Contas. Mas o que acha de incluir em um roteiro à região um passeio pré-histórico?
Pertinho de Lençóis, a cidade mais visitada da chapada, existe um atrativo pouco conhecido até mesmo dos baianos – e ignorado pela maioria dos guias turísticos – que é um verdadeiro museu a céu aberto com registros humanos datados de antes da invenção da escrita. Trata-se da Serra das Paridas, que integra um complexo arqueológico repleto de pinturas rupestres de milhares de anos catalogadas por pesquisadores e estudiosos (confira vídeo acima).

Como propaganda e bom-humor são importantes até mesmo para atrair audiência a uma galeria pré-histórica, o complexo colocou uma imagem do ET do filme de Spielberg em tamanho real logo depois da entrada principal, um pouco antes do estacionamento, em que há outra parada imperdível para fotos: painéis com figuras em tamanho real que sintetizam a evolução do homem, desde o primata até o homo sapiens (no caso, nós), passando por antepassados como o Neandertal, com quem chegamos a conviver há alguns milhares de anos.
Chegando ao complexo
A Serra das Paridas fica a 35km do centro de Lençóis, sendo 20km de estrada asfaltada (rodovia BR-242) até o distrito de Tanquinho (no sentido Andaraí) e o restante sem pavimentação, no mesmo trajeto que também leva à cachoeira do Mosquito (é possível visitar os dois atrativos em um dia tranquilamente, utilizando qualquer veículo e sem necessidade de guia da cidade). Todo o percurso é bem sinalizado, com placas.
O ingresso para a Serra das Paridas custa R$25 por pessoa e mais R$50 do guia que toma conta do complexo (negociável para grupos). As taxas servem para manter o espaço, que não recebe recursos públicos, em funcionamento. O estacionamento é amplo, sem cobrança de taxa adicional. O guardião e condutor é Renato Hayne (75 99631269), que conhece bem a história do complexo e as características das pinturas contidas em 18 sítios. O visitante tem acesso apenas a seis abrigos de um desses sítios, com cerca de mil desenhos, numa caminhada leve de 300 metros com subidas e descidas em volta de galerias rochosas.

Registros diversos
Uma equipe liderada por Etchevarne, que é do Museu de Arqueologia e Etnologia da Ufba e escreveu um livro sobre a Serra das Paridas (Escrito na Pedra), fez o trabalho de pesquisa e catalogação das pinturas. Não foram encontrados fósseis de seres humanos, mas, além dos desenhos, os pesquisadores se depararam com vários registros da presença de irmãos mais velhos, a exemplo de vestígios de materiais cortantes feitos com lascas de pedra ou de madeira e até de pedaços de rochas que não existiam na Serra das Paridas e foram levadas para lá pelo homem.

As pinturas revelam formas geométricas e o que seriam animais, movimentos de caça e pesca e até mulheres de cócoras em posição de dar a luz, daí uma das explicações para o nome Serra das Paridas. Como os desenhos foram produzidos com pigmentos minerais e não orgânicos, não foi possível datá-los pelo método do carbono 14. As datações foram feitas nos restos de fogueira, comprovando a presença humana na Serra das Paridas há pelo menos 8 mil anos. Durante o percurso pelas pinturas, algumas placas informam o visitante sobre características pré-históricas do lugar.
O som do xique-xique
Como o passeio acontece subindo e descendo por trilhas, o visitante pode apreciar um visual de parte dos morros da chapada, além de conhecer um pouco mais da vegetação da região, onde se encontram muitas mangabeiras e outras plantas típicas, a exemplo de bromélias, sempre-vivas e pés de xique-xique. Aliás, um dos pontos altos do passeio é quando Renato Hayne extrai, com uma das mãos, o “som” que produz o xique-xique (confira o vídeo acima), que dá origem a pratos saborosos da culinária local.
Pinturas em outros cantos
O território da Chapada Diamantina formou-se há quase 2 bilhões de anos, com altitudes que estão entre as maiores do Nordeste brasileiro e uma enorme riqueza ambiental, cultural, histórica e, claro, pré-histórica. A Serra das Paridas não é o único local na região cuja importância é reconhecida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em que o visitante pode encontrar pinturas ou grafismos rupestres.
Perto de Lençóis, por exemplo, está a Gruta da Lapa do Sol, classificada como um abrigo do homem pré-histórico. A formação geológica guarda pinturas, motivos geométricos, além de mãos registradas em diferentes períodos (como se nossos antepassados desejassem dizer que estiveram ali).
Em Palmeiras, as pinturas rupestres estão na Serra Negra e no sítio arqueológico do Matão. Em Ibicoara, na parte sul da Chapada, os registros foram encontrados na comunidade da Raposa – só pode ir com guia. Em Piatã, a cidade mais fria da região, desenhos de até 12 mil anos podem ser vistos na Serra do Gentio.

